quarta-feira, 4 de junho de 2008

'Adiação e 'dislatado'

Miguel Oliveira
Editor-Chefe

Quando me preparava para escrever esta crônica de quarta-feira, que dedicaria inteiramente a causos esportivos, fui surpreendido por um flash de uma repórter loirinha do canal 4, que empregou uma palavra inexistente no dicionário, tal qual um dos personagens do rádio santareno que me foi lembrado, dia desses, pelo ex-locutor esportivo da Rádio Rural de Santarém Cláudio Serique.
O mote deste texto semanal era a decisão da FIFA de cobrar das emissoras de rádio os direitos de transmissão da Copa do Mundo da África do Sul, como vem sendo obedecido pelas emissoras de televisão. Mas não pense que essa exigência é invenção da entidade máter do futebol mundial, com sede em Zurique.
Aqui mesmo em Santarém, no interior da Amazônia, embora malograda, a Liga Esportiva tentou, na década de 60, proibir a Rádio Rural de transmitir, sem nada pagar, os jogos realizados no velho estádio Elinaldo Barbosa. A direção da emissora protestou, a cobrança acabou dispensada, mas agora, sob o tacão da FIFA, as rádios das pequenas cidades, que não têm patrocínio para cobrir ao vivo uma copa do mundo, terão que desembolsar dinheiro mesmo que faça a (re)transmissão, desde o estúdio, tomando por base som e imagens das emissoras de televisão que detêm os direitos de transmissão.
Quem lembra dos acontecimentos esportivos do passado baseado nos relatos dos locutores Dário Tavares, Cláudio Serique, Tadeu Matos, Oti Santos e Olympio Guarany tem bons motivos para rememorar essa época de ouro do rádio esportivo e algumas pérolas ditas no ar por personagens como Abib Bechara e Jota Veiga, que vez por outra se repetem no rádio atual e, até, em emissoras de televisão, como aconteceu nesta terça-feira com a repórter loirinha da Tv Tapajós.
Conta Cláudio Serique - que começou narrar jogos aos 16 anos - que um comentarista escalado provisoriamente para acompanha-lo em uma jornada esportiva era Abib Bechara, que na falta do titular que estava naquele dia em evento religioso de casais, topou a missão, não sem antes avisar que entendida do metier.
Decorridos os primeiros comentários, Cláudio respirou aliviado e pensou: - Esse cara entende futebol.
Quando chegou o intervaldo da partida, recorda o narrador, Serique chamou Bechara para os 'comentários intermediários', mais longos que os do decorrer do primeiro tempo. Tão logo lhe passou o microfone, Serique já se preparava para descer da cabine em busca de um gole de cerveja que lhe amaciasse a voz para o segundo tempo, quando ouviu essa pérola: "Senhores ouvintes, o São Raimundo poderia estar vencendo a partida por um placar mais 'dislatado'.
Serique só teve tempo de dar meia-volta, por entre os degraus da velha escada de madeira, e praticamente arrancar o microfone das mãos do comentarista. Repórteres de campo assumiram a transmissão no intervaldo enquanto o narrador tomava satisfação por erro tão grave pronunciado na Rádio Rural, uma idiossincrasia naquela época.
- Não é 'dislatado', Bechara. É dilatado, atalhou Serique.
- Negativo, respondeu-lhe. Diz-me uma coisa, Cláudio. O placar está dentro de uma lata para ser dilatado? questionou.
-Não, retrucou Serique.
-Então é 'dislatado' mesmo. Se fosse dentro da lata, mas não é com tu mesmo dizes, seria dilatado, encerrou Bechara na única vez em que atuou como comentarista.
Hoje, ao assistir um flash da repórter de televisão sobre normas para uso de capacete, fui surpreendido com uma pérola que me fez lembrar dessa engraçada 'estória' de Bechara contada pelo próprio Cláudio Serique.
- As novas normas sobre uso do capacete deveriam ter entrado em vigor no mês passado, mas houve uma 'adiação' desse prazo pelo Denatran, disse a jovem repórter.
Por causa dessa ‘adiação’, houve um adiamento dos outros causos para as próximas edições.

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Nesta crônica, publicada na edição impressa do jorna,l o nome de Abib Bechara foi erroneamente substituído pelo de Eufrázio Brito.

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