sexta-feira, 1 de maio de 2009

O que muda com o fim da Lei de Impensa

Sessão também foi marcada pelo primeiro encontro entre Gilmar
Mendes (sentado, à frente) e Joaquim Barbosa (à direita, ao fundo)
após discussão


Supremo põe fim à legislação que vigorava desde a ditadura militar, por considerar que feria a Constituição. Apenas Marco Aurélio Mello quis manter o texto na íntegra



Aprovada em plena ditadura militar e apontada como entulho dos anos de chumbo, a Lei de Imprensa (Lei 5.250, de 1967) foi sepultada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em julgamento finalizado ontem, a maioria dos ministros entendeu que ela vai de encontro à Constituição Federal e que, portanto, deve ser totalmente revogada. Essa foi a posição de sete dos 11 ministros. Outros três queriam manter parte do texto e apenas um, Marco Aurélio Mello, defendeu a manutenção de toda a matéria. A Lei de Imprensa estabelecia a censura prévia a veículos de comunicação e a apreensão de publicações, além de prever penas mais duras para jornalistas que cometessem crimes de calúnia, injúria e difamação do que as previstas no Código Penal.

O Supremo aceitou um pedido feito pelo PDT para banir todo o texto. Apesar da decisão, ministros informaram que partes envolvidas em processos poderão entrar com embargos no tribunal para esclarecer alguns pontos do julgamento. A tendência é que os juízes, a partir de agora, apliquem dispositivos dos códigos Penal e Civil e da própria Constituição em decisões. Outras ações podem ser arquivadas.

A discussão começou em 1º de abril, quando o relator, Carlos Ayres Britto, e Eros Grau defenderam a revogação da lei. Ontem, nove ministros votaram. Carlos Alberto Menezes Direito, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Cezar Peluso e Celso de Mello acompanharam o relator. “A liberdade de imprensa não se compraz com uma lei feita com a preocupação de restringi-la, de criar dificuldades ao exercício dessa instituição política”, afirmou Menezes Direito, primeiro a votar. “O diploma legal se mostra totalmente incompatível com os princípios da Constituição”, completou Ricardo Lewandowski.

Preconceito
Joaquim Barbosa e Ellen Gracie sustentaram que a maior parte do texto deveria cair. Eles opinaram, no entanto, a favor da manutenção dos artigos que tratam dos crimes de calúnia, injúria e difamação e de delitos de guerra, entre outros. Barbosa chegou a dizer que revogar toda a lei seria uma posição “radical”. “A imprensa pode ser destrutiva não apenas em relação a agentes públicos. Pode destruir vidas de pessoas privadas, como temos assistido nesse país”, declarou, na primeira aparição após o bate-boca com o presidente do Supremo (leia mais abaixo).

Mendes, aliás, queria manter todos os artigos da Lei de Imprensa que tratavam do direito de resposta. Ele citou como exemplo o episódio da Escola Base, quando reportagens citaram suposto abuso sexual contra crianças, o que acabou não sendo comprovado. E disse que o julgamento deveria servir de exemplo para que veículos de comunicação fizessem um processo de autorregulamentação. “A desigualdade de armas entre a mídia e o indivíduo é patente”, afirmou.

Em posição isolada, Marco Aurélio defendeu manter todo o texto. Ele disse que derrubar a lei causaria um vácuo jurídico. Por isso, sustentou que caberia ao Congresso aprovar nova lei. “O que teremos no dia seguinte, quando não tivermos mais uma lei para regrar (a atividade jornalística)? Deixemos à carga dos representantes do povo brasileiro a edição de uma lei que substitua essa sem ter-se, enquanto isso, o vácuo, que só leva à babel, à bagunça, à insegurança jurídica sem uma normatização”, disse.


As Alterações

O que muda com a revogação da lei

Calúnia
O artigo 20 da Lei de Imprensa prevê pena de seis meses a três anos de prisão, além de multa. Já o artigo 138 do Código Penal diz que a punição é reclusão de seis meses a dois anos e multa.

Difamação
O artigo 21 da Lei de Imprensa prevê pena de três meses a um ano e meio de prisão e multa. Já o artigo 139 do Código Penal diz que a punição é reclusão de três meses a um ano de prisão e multa.

Injúria
O artigo 22 da Lei de Imprensa prevê pena de um mês a um ano de prisão e multa. Já o artigo 140 do Código Penal diz que a punição varia de um mês a seis meses de prisão ou multa.

Indenização
O artigo 51 da Lei de Imprensa prevê que a indenização deve ser fixada em valores entre dois e 20 salários mínimos. Os artigos 20 e 297 do Código Civil dizem que quem sofre dano à imagem ou honra tem direito a indenização e que quem pratica ato ilícito fica obrigado a repará-lo. O artigo 5º da Constituição Federal também trata do tema. Nenhum deles fixa valores para a indenização.

Prisão especial
O artigo 66 da Lei de Imprensa diz que o jornalista só pode ser preso se tiver sido condenado em última instância, em sala “decente”, “arejada” e onde encontre “todas as comodidades”. O artigo 295 do Código de Processo Penal diz que quem tem diploma de curso superior tem direito à prisão especial.

Direito de resposta
Os artigos 29 a 36 da Lei de Imprensa tratam do tema. Um dos itens diz que o prazo para pedir direito de resposta é de 60 dias e que, a partir da decisão do juiz, o veículo tem 24 horas para publicar a resposta. Já o Código Civil não fixa prazo. Na prática, ao analisar processos, os juízes vão começar a delinear o entendimento sobre o assunto.


para saber mais
Prisões e multas

A Lei de Imprensa entrou em vigor em 14 de março de 1967, no final do governo Castello Branco. Ela tem sete capítulos e 77 artigos. O texto é apontado por muitos como defasado e em desarmonia com a realidade atual. A lei previa prisões e multas pesadas contra profissionais em casos de injúria, calúnia e difamação.

As decisões, agora, deverão ser feitas com base na Constituição e nos códigos Civil e Penal, que preveem penas mais brandas. Jornalistas e veículos de comunicação também poderiam ser processados se publicassem algo que ofendesse “a moral pública e os bons costumes”. A revogação do texto altera ainda a indenização para crimes de danos à imagem e à honra. O artigo 51 previa valores entre dois e 20 salários mínimos, enquanto o Código Civil e a Constituição Federal não estabelecem limites.

Também mudou o direito de resposta. A lei dizia que toda pessoa, órgão ou entidade pública a “cujo respeito os meios de informação veicularem fato inverídico ou errôneo” têm direito a resposta ou retificação. Agora, os juízes terão que analisar caso a caso. (MD)


Texto:
Mirella D’Elia( Correio Braziliense)
Foto:
Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr

Um comentário:

Bruna Essig disse...

A Lei de Imprensa poderia até ser um resquício da ditadrua, mas podia regular e at´prevenir atitudes erradas dos jornalistas. Se com a lei que era mais severa não havia respeito por parte de veículos do comunicação, sem a Lei, com base na Constituição que é mais branda como será? Já estamos na farra, será que tem como piorar? À propósito: O diploma não deve cair. Quem não estuda no mínimo 4 anos, não tem competência técnica, teórica e ética pra desempenhar a função.