segunda-feira, 29 de junho de 2009

A saga dos nordestinos - 1ª parte

Hélcio Amaral de Souza

Desde o período colonial que o nordeste brasileiro registra uma das mais desenvolvidas densidades demográficas, formadas por homens e mulheres destemidos, valentes e dotados de incomparável espírito de aventura, dispostos a enfrentar adversidades tão graves ou maiores que as vividas no sertão onde o solo árido e as prolongadas estiagens deixaram cicatrizes profundas na vida destes bravos brasileiros. Desesperados, procuraram outros locais e regiões onde a vida mostrasse um futuro mais promissor para seus filhos e netos e assim espalharam-se para outros centos sempre impelidos pela desejo do sucesso, voltados para o trabalho da agricultura manual, tirocínio para o comércio, financistas, ambicionando sempre o enriquecimento onde o comércio é a espinha dorsal.

A economia na Amazônia é composta de atividades cíclicas baseadas em extrativismo e cultura permanente, sendo as mais marcantes: DROGAS DO SERTÃO, CACAU, BORRACHA, JUTA e OURO. Em todos esses ciclos a história registra presença do homem nordestino contribuindo com o desenvolvimento econômico, miscigenando e ocupando o grande vazio desta imensa região. Não houve trabalho que o homem nordestino temesse. A imensidão líquida não foi obstáculo até mesmo para os que estavam habituados a prolongadas e castigantes secas. Alguns se tornaram hábeis navegadores do rio Amazonas e com bastante eficiência assumiram o comando de navios regionais e uma grande maioria habituou-se ao manejo das pequenas e arriscadas canoas e igarités, por ser estes os únicos meios de transporte que possibilitava acessar a margem dos rios onde se fixava a grande maioria da população amazônica. Não existiam estradas e até mesmo as vicinais carroçáveis eram de pouca distância.

A história nos mostra que na revolução cabana, em 1835, os nordestinos, Angelim e Vinagre lideraram e comandaram com bravura aquele movimento nativista alcançando a vitória, fato que se tornou marco na história da Amazônia.

Após a abertura da navegação motorizada no rio amazonas, em janeiro de l852, a presença do homem nordestino se tornou mais freqüente. As comunidades receberam trabalhadores braçais, médicos, agrimensores e advogados que ocuparam cargo de juiz, promotor, professor ou profissionais liberais que participaram da vida pública e privada acelerando a economia e desenvolvendo a política da região. A faculdade de direito do Ceará, por ser mais antiga do que a do Pará, encaminhou inúmeros juristas que chegaram a assumir a presidência e demais cargos da justiça paraense. Foi na década de 80 do século XIX que o fluxo migratório intensificou. A propaganda exacerbada da riqueza causada pela comercialização da borracha, despertou uma cobiça a todos os povos do mundo inteiro e nossos irmãos nordestinos foram os mais presentes nesta corrida em busca do enriquecimento fácil e rápido coletando a goma elástica para alimentar os carentes e insaciáveis mercados europeus e americanos que experimentavam a grande corrida da revolução industrial. Foi instalada em todo nordeste agencias alistando trabalhadores para a coleta de látex nas florestas da Amazônia. Os alistados eram encaminhados aos seringalistas, coronéis de grandes áreas localizadas à margem dos rios. As despesas de passagem e alimentação, desde o momento em que saiam do nordeste, eram debitadas ao alistado e anotadas no caderno de aviamento (conta corrente) junto com o rancho necessário a sobrevivência da permanência na floresta e que seria ajustado no momento da entrega do produto (borracha), coletado no período, que em grupo ou sozinhos permaneciam na floresta durante o período de estiagem, considerado o mais apropriado para a coleta do látex. A falta de princípios éticos e morais do “patrão” (seringalista ou aviador) impossibilitava o pobre seringueiro obter saldo positivo em sua conta, o que o obrigava viver em constante submissão, coagido até com ameaça de morte, caso desistisse da atividade.

Os artigos de subsistências recebidos para a sobrevivência na floresta eram anotados unicamente as quantidades e o preço só eram colocados no momento da entrega do produto. O preço arbitrado para a borracha, no momento da entrega, nem sempre correspondia ao valor dos artigos de subsistência recebidos e muito menos correspondia a um determinado percentual do valor de exportação do produto para o mercado externo. Não havia forma diferente de parceria nessa atividade. Todos os seringalistas eram inescrupulosos, rudes e truculentos, não se tem informação de um só que fosse diferente.

Na última década do governo Imperial, viveu no Pará um nordestino de Crato, que se tornou um mito; foi o coronel José Júlio de Andrade. Segundo o escritor Cristóvão Lins, em seu livro, Setenta Anos de Império Jarí, José Júlio foi um dos homens mais famosos e poderosos do Pará na última década do século XIX e início do século XX. Tinha bastante dinheiro, fama , influência política, prestígio entre os homens de negócio e se tornou o maior latifundiário do mundo, tendo dentro de sua propriedade um rio, Rio Jarí, desde a nascente até a foz. Na sede de seu império, Arumanduba, as companhias de teatro e ópera francesas, se exibiam, mesmo não tendo um teatro. Sua principal atividade era o extrativismo, tendo a castanha e a borracha como os principais, produtos. Diz o escritor que se não tivesse ocorrido uma forte arenga entre ele e o interventor do Pará, General Joaquim Cardoso de Magalhães Barata, provavelmente ele teria sido convidado para ser candidato a governador do Pará. Diz ainda o cuidadoso escritor, que José Júlio falava corretamente oito idiomas e que lia os clássicos gregos e romanos em sua original. A verdade é quer a fama de José Júlio, perdura até hoje na região do Rio Jarí onde mais tarde veio se estabelecer a Empresa Agro Florestal Jarí.


Nenhum comentário: