terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Mascarado Fobó (2)



Arrastão do bloco Unidos do Morro, no carnaval do Mascarado Fobó, ontem, em Óbidos.
Foto: Tamara Saré

Cidadão-de-arco-e-flecha, o caboclo Vicente Salles

Lúcio Flávio Pinto

Em 2011 Vicente Salles completará 80 anos de vida e 63 de atividades intelectuais fecundas, que se espraiam por vários afluentes do saber: antropologia, história, folclore, musicologia, jornalismo. Sendo múltiplo, Vicente é uno. Produz incansavelmente, como raros. Mas mantém coerência com seu compromisso de revelar o que está oculto, encontrar o que está perdido, denunciar a causa da incultura e da inconsciência.

Superando as doenças que o têm acometido nos últimos anos e renascendo com as sementes do otimismo, ele surpreende mais uma vez com um livro único: Estórias do Eldorado nos tempos calamitosos da devastação contadas pelo cidadão-de-arco-e-flecha e escritas pelo folclorista e historiador Vicente Salles – Fantasia desconcertante (Thesaurus Editora, Brasília, 179 páginas).

Em tom de folhetim, mas com as marcas da literatura de cordel, Vicente incorpora na plenitude a “designação pejorativa dos habitantes em geral e dos políticos da Amazônia que circulou no Rio de Janeiro, no parlamento e na imprensa, nos últimos tempos da monarquia”, conforme o autor o define no Índice de Particularidades, um anexo instrutivo e orientador, juntamente com o Índice Onomástico. O cidadão-de-arco-e-flecha recriado por Vicente conhece a própria história, sabe interpretá-la e valorizá-la. Faz dela sua arma de combate em defesa dos seus valores e contra o “arrivista semiculto”, que serve de biombo à destruição da Amazônia e ao estabelecimento do colonizador.

O livro é a 2ª edição, corrigida e ampliada, do 15º volume das micro-edições do autor (armas da guerrilha cultural que travou contra a desmemória regional e a arrogância externa), lançada em 1998, que continha as “estorinhas infantis” publicadas originalmente na imprensa local entre 1970 e 1981. São crônicas que divertem, instruem, informam, alertam e iluminam. Vicente circula com naturalidade por todos os temas, que aprendeu de leituras e de vivências. Conhece as pessoas, os lugares e os acontecimentos, de muitos dos quais é testemunha e de outros, referência. Por isso, fala com intimidade, pleno conhecimento de causa. Com indignação, mas também ironia e humor, as melhores ferramentas para a tarefa de desmontar os preconceitos e as deturpações históricas.

A força de Vicente nesses desafios provém de sua atitude diante da vida: uma combinação de simplicidade com rigor, de tolerância com integridade, de bonomia com altivez. E cobrindo essas qualidades, a posição que assumiu, ao lado da sua terra, do seu habitante, da sua história, intransigente na exigência de que a voz do nativo seja ouvida e sua vontade considerada. É uma prerrogativa da sua própria existência e do que construiu antes da chegada do colonizador, do novo dono de tudo, como reclama num dos trechos mais expressivos do texto:

“João Bobo viu que o bumbá era uma festa e aprendeu a lição do repartimento do boi. Entonce foi pro rei e disse que assim, reizinho, se faz o repartimento do Eldorado: tira o Arumanduba do coronel Zé Júlio e dá pro Daniel Ludwig; tira o Amapá todinho do Cabralzinho e dá pro Antunes, primo do Roqueféler; tira o sul do Grão-Pará dos índios e dá pr’aquela fabriqueta de automóveis, tadinha; os minérios, ou seja, o filé minhão, tira ele e a gente dá um, jeito com os contratos de risco com a mineradora Vale do Rio Doce; o Trombetas tira dos mocambeiros e dá pro japonês que só tem quatro filhos... E escancara a terra do povo Baré, fazendo franca a zona!”

Para quem não consegue acompanhar sua verve em evolução acelerada, alfinetando ou esbofeteando os transgressores, Vicente acrescentou os dois anexos, com informações sumárias mas, muitas vezes, inéditas ou difíceis de encontrar, que são guias para levarem o leitor a novas incursões no mundo cultural amazônico, região que está muito longe de ser um deserto de inteligências, ao contrário do que proclama o conquistador e seus aliados arrivistas semicultos. Vicente Salles dá as pistas e se coloca numa versão indígena do filósofo grego Diógenes: armado de poranga no lugar da mitológica lanterna, à cata de um verdadeiro homem, Vicente acabará encontrando-o diante do espelho.

Índice dos personagens

Selecionei duas das descrições de Vicente Salles de personagens da história contemporânea da Amazônia, como um aperitivo para a leitura completa do seu livro. Verbetes concisos e densamente informativos. Definidores.

ANTUNES. Família de capitalistas brasileiros oriunda do Rio Grande do Norte que se aplicou aos negócios de minérios. Associada a capitalista norteamericano, a grande empresa dos Antunes (Icomi) explorou até a exaustão o manganês do Amapá, ficou à frente do consórcio que deu continuidade à aventura amazônica de Daniel Ludwig, no Jari, com enormes perdas de capitais públicos e privados.

CURIÓ. Coronel. Déspota no tempo da ditadura militar de 1964 foi despachado para “domar” os garimpeiros de Serra Pelada e a guerrilha do Araguaia. Acabou ganhando prestígio político local e até emprestou o nome para batizar uma comunidade plantada na área devastada do sul do Pará e que ele próprio administrou. Caso curioso de construção de um (pseudo) mito político.

Serra é pós-Lula, analisa El País

Correio Braziliense

Um artigo no diário espanhol El País de ontem avalia que, qualquer que seja o vencedor das eleições de outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sairá, simbolicamente, vencedor da disputa. Segundo o texto, assinado pelo correspondente do jornal no Brasil, Juan Árias, mesmo na hipótese de vitória do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), as conquistas sociais da gestão petista seriam mantidas, e, com isso, Lula estaria, de certa forma, presente no próximo governo.

Seria de se supor, diz o artigo, que uma vitória de Serra significasse “alternância normal, interrompendo de alguma forma a continuidade do PT no poder”. Mas o autor acredita que o governador não seria um “anti-Lula” mas um “pós-Lula”: “Com Serra, o Brasil seria um país sem Lula, mas ainda com Lula, no sentido de que o governador paulista não nega nenhuma das conquistas sociais de seu governo.” O texto avalia que o tucano está “à esquerda” do atual governo e que não faria uma gestão idêntica à do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso: “Para Serra, seu governo não seria uma fotocópia do passado social-democrata, mas uma página nova”.

Juan Árias aposta em uma disputa acirrada na eleição presidencial e descreve Dilma como “uma espécie de sombra” do presidente. “Se ela vencer, as eleições seriam na verdade um terceiro mandato de Lula e garantiriam a continuidade de um certo lulismo”, avalia. A conclusão do texto é a de que a condução do país não mudará seja quem for o eleito: “A partir do próximo dia 1º de janeiro, o Brasil será um Brasil sem Lula. O que acontecerá? Nada”, diz o repórter. “Continuará sendo um país com instituições democráticas consolidadas, que não apenas conseguiu sair, sem se quebrar, da crise mundial, mas que está crescendo; um país sem possibilidades de golpe de nenhum tipo e que, apesar de alguns rompantes populistas em alguns momentos — sobretudo pela influência do chavismo — não se deixou arrastar pelo populismo da vez na América Latina.

Fobós arrastam multidões em Óbidos

O Carnaval dos Fobós de Óbidos, um dos maiores carnavais do Oeste do Pará, arrasta multidões pelas ruas da cidade histórica.

Mascarados Fobós e palhaços revivem antigos carnavais.
O carnaval obidense tem suas raízes cravadas no século XVIII , vindo de Portugal com o nome de 'Entrudo', espécie de desafio travado entre famílias tradicionais.
Todo fim de tarde, aos domingos, antes do Carnaval, os blocos de fobó fazem arrastão experimental para conferir e ajustar o percurso da apresentação oficial. Levam em média 2,5 mil brincantes ao fobódromo, a Praça do Sesquicentenário, onde são recebidos por uma
grande platéia.

Os Fobós brincam vestidos com Dominó, um tipo de macacão feito em chita, bastante largo e colorido, capacete feito em papel de saco
de cimento e papel de seda em cores diversas, além de uma máscara feita artesanalmente, apito, bexiga e caixa de pó de arroz ou amido de milho. No arrastão, o povo segue o trio elétrico, brincando, cantando e lançando polvilho tanto nos brincantes quanto na platéia. Nem mesmo os policiais que fazem a segurança escapam.

O bloco Chupa Osso, desfilou no domingo (14), e o Unidos do Morro, na segunda (15).
(Com informações da Secom e fotos de Tamara Saré)