segunda-feira, 14 de março de 2016

Veja e não leia...

Lúcio Flávio Pinto:

Com a edição que colocou agora nas ruas, Veja renunciou à sua condição de revista semanal de informações (a quarta ou quinta mais importante do mundo) e se transformou em publicação de humor, do mais negro e involuntário humor, se me permitem os politicamente corretos. Uma revista de deboche, de sarcasmo e ironia grosseira.
A capa traz a foto retocada de Lula, transformado em medusa, numa cascavel. Competente na criação de fraseologias de forte apelo popular, ele foi infeliz ao se comparar a uma jararaca. Pensou no uso da imagem como referência à força e capacidade de resistência do animal, uma serpente perigosa, mas útil
Acabou oferecendo um prato cheio à ironia e a interpretações opostas à sua intenção. A revista não apenas tratou de apresentar a relação do serpentário de Lula como manifestou, da forma mais explícita e extremada possível, seu projeto de acabar com o ex-presidente da república. De pisar na sua cabeça e não na cauda, para que, desta vez, não escape, como conseguiu no episódio do mensalão.
Nesse ponto, imitou os três promotores de justiça do Estado de São Paulo, que se precipitaram numa denúncia voluntarista. A peça mais cabia como artigo na imprensa. A técnica da petição jurídica foi deixada de lado e seu anexo era uma indevida cautelar pedindo a prisão antecipada de Lula. Ficou nítida a busca de estrelismo e o caráter subjetivo da iniciativa.
Veja foi além: renunciou ao jornalismo e voltou atrás, à época dos panfletos da imprensa incendiária de décadas ou séculos atrás, quando os fatos e a verdade importavam menos do que o tom rascante da acusação. Quanto mais ruidosa, maior efeito podia provocar.
É uma pena que a revista tenha decidido assim. Como leitor, jornalista e um dos profissionais que trabalhou na revista no seu início, fiquei chocado e triste pelo que uma publicação com o currículo de Veja cometeu. Mais do que o epitáfio antecipado de Lula, uma antecipação do destino ao qual a revista estará condenada se prosseguir nessa direção.